A Sofid, a Funcex e a Cooperação Luso-Brasileira

12 Outubro 2022
/ Revista Brasileira de Comércio Exterior

Por António Rebelo de Sousa, presidente da Sofid e professor catedrático da Universidade Lusíada



1) O senhor poderia explanar e explicar quais eram as principais diretrizes do governo português em relação ao apoio e à implementação de projetos de cooperação econômica e técnica em países de menor desenvolvimento econômico relativo, em especial os países da África, do Caribe e os de língua portuguesa?

Respondendo ao desafio que me foi lançado pelo meu amigo, dr. Antônio da Silveira Pinheiro, presidente da Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior (Funcex), procurarei esclarecer sobre o papel da Sociedade para o Financiamento do Desenvolvimento (Sofid) – sociedade de desenvolvimento portuguesa –, a qual pretende, no essencial, contribuir para o
desenvolvimento sustentável dos países em via de desenvolvimento (PVDs) e para a internacionalização da economia portuguesa, estimulando o progresso econômico e social, em articulação com os objetivos desenvolvimentistas no domínio das políticas de cooperação que o governo português se propõe implementar.

Muito embora a Sofid tenha sido criada em dezembro de 2007, só a partir de 2010 começou a dispor dos instrumentos necessários ao desenvolvimento da sua atividade de uma forma mais integrada, baseando-se nos princípios da adicionalidade (acrescentar algo às instituições já
existentes na mesma área de intervenção), da eficiência (com base em critérios de rendibilidade financeira) e da sustentabilidade (numa perspectiva econômica, social e ambiental).

2) O senhor poderia citar exemplos de projetos de alto impacto apoiados nessas regiões?

Entre 2010 e 2021, a Sofid financiou operações em 13 países, nomeadamente, África do Sul, Brasil, Cabo Verde, Chile, Colômbia, Costa do Marfim, Guiné-Conacri, Marrocos, México, Moçambique e São Tomé e Príncipe. A esta lista viria juntar-se, em 2022, o Gana, sendo, ainda, de salientar que, no mesmo período de 2010-2021, foram financiados mais de 30 projetos, totalizando investimentos de, aproximadamente, 180 milhões de euros. Os principais investimentos ocorreram na Costa do Marfim (27% da carteira), em Moçambique (25%) e em Angola (23%).

3) Quais os tipos de projetos, ações e atividades apoiados e propostos nesses projetos?

Os principais setores objeto de financiamento foram os das Infraestruturas (construção civil, engenharia, mobilidade, gestão de recursos hídricos e resíduos), Energia (no segmento das renováveis), Agroindústria, Tecnologias da Informação, Comunicação e Electrônica, Comércio, Serviços, Turismo e Saúde. No ano corrente de 2022, foram concretizadas duas importantes operações, em Marrocos e no Gana, totalizando investimentos globais de cerca de 100 milhões de euros, nas áreas das Infraestruturas de Moblidade e do Sector Automóvel. O Brasil representa, apenas, 6% dos projetos financiados pela Sofid, correspondendo a um investimento total de 11 milhões de euros, nos setores da Energia e da Indústria.

4) E, nesse novo normal pós-Covid, há novas diretrizes? E quais são as condicionalidades para submeter projetos para a Sofid?

A Sofid é, também, a interlocutora, em Portugal, da Comissão Europeia para efeitos de blending, novo instrumento financeiro de grande relevância no quadro da cooperação multilateralismo, de acordo com o qual se procura conciliar a ajuda a fundo perdido (numa percentagem importante dos investimentos a efetivar em PVD’s) com a comparticipação de investimentos do setor privado ou de instituições financeiras multilaterais. Também poderá funcionar como interlocutora ou mesmo como arranger junto do Banco Europeu de Investimento (BEI) no acesso de empresas portuguesas a determinados fundos, com destaque para o African Infrastructure Investment Fund, para a Neibourghood Investment Facility e para o Latin América Infrastructure Fund. Por outro lado, a Sofid pode gerir fundos, sendo, por exemplo, responsável pela gestão do Fundo Investimoz em Moçambique, o qual envolve um montante global de 94 milhões de euros. A Sofid, todavia, atravessa uma fase de redefinição do seu objecto, em certos domínios, podendo vir a espandir a sua esfera de intervenção a outras áreas e, dessa forma, estar mais presente nas vertentes da cooperação financeira bilateral e multilateral.

5) O senhor poderia explanar detalhes de como as empresas brasileiras que queiram ter presença nas regiões de atuação da Sofid devem desenvolver suas propostas?

A 8 de julho do corrente ano, a Sofid celebrou um Memorando de Entendimento (MoU), que visa promover as relações empresariais entre Portugal e Brasil por meio de uma maior partilha de informações sobre oportunidades de negócios e de investimentos, da elaboração de conteúdos sobre comércio exterior e da organização de iniciativas conjuntas que impulsionem a internacionalização das empresas portuguesas e brasileiras. A Sofid perspectiva alargar a linha de crédito BEI por forma a englobar os países da América Latina, e a Estratégia de Cooperação 2030 tende a realçar a importância do aumento do investimento direto português na Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), reforçando-se, ainda, a importância da língua como instrumento do desenvolvimento da atividade econômica.

6) Que sugestões o senhor daria para as empresas brasileiras que desejam se lançar nesse novo ambiente internacional?

Em Novembro de 2021, após a visita de Sua Excelência o presidente da República Portuguesa ao Brasil, foi assinado um MoU entre o Ministério do Negócios Estrangeiros (MNE) e o Ministério do Ambiente (MA) portugueses e oMinistério do Desenvolvimento Regional (MDR) brasileiro, envolvendo matérias atinentes a recursos hídricos e de saneamento. Na mesma oportunidade, o MDR celebrou vários MoU’s com diferentes entidades, a saber, a Associação dos Industriais da Construção Civil e Obras Públicas (AICCOPN), a Parceria Portuguesa para a Água, a Associação Portuguesa de Projeistas e Consultores, a Associação SmartWaste Portugal e a Associação das Empresas Portuguesas para o Sector do Ambiente. Reconhecendo-se a relevância da problemática da gestão da água e do saneamento para o bem-estar das sociedades e para o desenvolvimento das economias dos dois países, estes novos instrumentos visaram intensificar a cooperação bilateral, promovendo-se os critérios ambientais, sociais e de “boa governança”. Estas deverão ser algumas das áreas de atividade em que a Sofid deverá concentrar a sua estratégia de intervenção no Brasil.

7) Que mensagem o senhor gostaria de transmitir ao trade brasileiro?

Sintetizando, a Sofid e a Funcex estão genuinamente empenhadas no reforço das relações empresariais entre os dois países, cujas economias apresentam fatores particularizantes de desenvolvimento que poderão gerar, no futuro, novas sinergias para a obtenção de patamares superiores de bem-estar nas duas comunidades irmãs, a saber, a brasileira e a portuguesa.

Lisboa, 5 de setembro de 2022

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