Miguel Lins, Vice-presidente da Funcex
Para iniciar uma análise que permita identificar no momento presente oportunidades para o Brasil, devemos revelar ao leitor a ideia sobre quais “ombros de gigantes” estamos fundamentados para “usar o entendimento adquirido por grandes pensadores que vieram antes para fazer progressos intelectuais”. De Winston Churchill usamos: “Quanto mais para trás se puder olhar, mais para a frente é provável que se veja”. Por sua vez, de Keynes usamos que “as ideias de economistas e filósofos políticos, tanto quando estão certos como quando estão errados, são mais poderosas do que é comumente entendido”. De fato, o mundo é governado por poucos homens práticos, que acreditam ser bastante isentos de qualquer influência intelectual, mas são geralmente escravos de algum economista morto. Em face do momento atual que estamos vivendo devemos levar ainda em consideração o seguinte aforismo de Winston Churchill: “Toda a história do mundo pode ser resumida pelo fato de que, quando as nações são fortes, nem sempre são justas, e quando elas querem ser justas já não são mais fortes”.
Por que há oportunidades para o Brasil nesse mundo novo econômico. Sob uma perspectiva histórica pode-se constatar que para cada mercado/país que o Brasil estabelece e desenvolve relações comerciais de compra, venda de bens, serviços e assets (títulos e haveres), em cada espaço geográfico, região, país e/ou bloco econômico há: i) queda nos custos de comunicação; ii) queda nos custos de transportes; iii) queda nas tarifas aduaneiras incidentes nas importações que são cobradas nas fronteiras do Brasil; iv) acordos preferenciais e de complementação econômica que incentivam as trocas entre o Brasil e seus parceiros comerciais ; v) uma entrada, uma maior variedade e uma diversificação de bens, serviços e assets realizados pelos operadores – traders – que atuam nas pontas de compra e venda internacionais; vi) cada vez mais empresas, no Brasil, vendendo e comprando bens para exportar (em 2021 somavam cerca de 31 mil), e para importar (em 2021 eram cerca de 44 mil); vii) otimização de economias de escala e de escopo que estão sendo obtidas ao nível de chão de fábrica e em determinados setores; e viii) em nível de firmas, há otimização e inovação de tecnologias de produto e processo; e também intensificação do uso dos recursos naturais e otimização das dotações de fatores. Nesse olhar de longa duração em termos temporais observa-se que a localização geográfica e histórica onde estão as empresas, os clusters ou as aglomerações econômicas, no Brasil, incentiva a entrada e a permanência e a estruturação de uma corrente de comércio que induz o Brasil a participar de todas as fases de globalização econômica, de constituição e inserção em cadeias globais de valor, e de acesso a mercados externos para criar comércio e negócios internacionais.
De fato, em 2021 a corrente de comércio (soma de exportações e importações) do Brasil foi recorde pois somou US$ 499,8 bilhões. Esses valores poderiam ser muito maiores não fosse o chamado “Custo - Brasil”. Torna-se indispensável remover os obstáculos que travam a remoção desse custo visível e sofrido pelas empresas no Brasil. É preciso compreender que a inserção no mercado internacional e nas cadeias de valor, sobretudo na vertente das exportações, passa por adotar no próximo governo medidas concretas nas áreas de financiamento às exportações; de tributação do comércio exterior; de facilitação do comércio; de logística do comércio exterior; e de promoção às exportações.
A inserção das empresas brasileiras, quer sejam aquelas que nunca operaram no comércio exterior quer sejam as que operam com continuidade ou são estreantes, pode ser incentivada e potencializada por meio da expansão do comércio de bens, serviços e assets com base, sobretudo, em novos negócios sustentáveis associados à marca, à imagem e à cultura brasileira apesar da nova conformação geopolítica e econômica em gestação no mundo.
Nossa estrutura de bens e serviços, historicamente, sempre foi moldada e conformada – notadamente com base nos bens intensivos em recursos naturais renováveis (oriundos do agronegócio) e de recursos não renováveis (provenientes das atividades de mineração, óleo e gás, e indústria de transformação) são comercializados em diversos países e regiões do mundo, o que nos torna um Global Trader. No grupo de produtos manufaturados os mercados prioritários para as nossas vendas externas são a América latina e a África. Em resumo, apesar da presença do Custo Brasil e da perda de participação dos manufaturados na pauta brasileira nos últimos anos, a pauta de exportação nacional ainda se apresenta diversificada em termos de produtos e mercados. Essa singularidade – caso haja incentivos como acesso a financiamento e seguro de crédito e não incidência de resíduos tributários nas exportações e ainda haja redução do Custo Brasil – significa que poderá expandir a corrente de comércio exterior nacional nos próximos quatros anos.
Temos, podemos e devemos potencializar os acordos comerciais já firmados – principalmente no âmbito da Aladi e do SGPC, e inclusive com os nossos parceiros do Mercosul. Devemos identificar os produtos que já exportamos e cotejar com a Cláusula de Nação mais Favorecida no âmbito da OMC para serem objeto de ações de promoção comercial específica a serem realizadas por parceria entre a Apex-Brasil, MRE e o setor privado. Além disso, potencializar os acordos de facilitação de comércio já firmados e inclusive agregar e assinar novos acordos com outros países deve ser uma prioridade. Aliás, é estratégico e prioritário expandir os usuários do sistema OEA (operador econômico autorizado) adicionando empresas exportadoras fortemente usuárias do sistema de drawback, e incentivar as empresas operadoras a usarem o regime de drawback de serviços. Esse procedimento simples criaria verdadeiras plataformas de exportação. E, com um pouco de apoio do fisco federal e estadual – com essas plataformas – seriam evitadas tanto a incidência de acúmulos de ICMS, quanto a necessidade de se usar o reintegro nas operações de exportações.
Isso mostra que, com algum esforço dos governos federal e estadual e, sobretudo, devido ao desejo de fazer negócios no exterior de empreendedores e dos gestores que atuam nas empresas nacionais é lícito esperar um movimento mais intenso em prol de uma maior orientação externa das empresas brasileiras, apesar do atual cenário internacional. Há riscos e incertezas derivados de a) novos tipos de vírus e sua difusão entre os seres humanos; b) quebra de cadeias de suprimentos e aumento dos custos de fretes; c) dificuldades institucionais e negociais no âmbito da OMC; d) tensão comercial entre os Estados Unidos e a China; e d) tensão militar entre a Rússia e a Ucrânia. Esses riscos e incertezas geram uma tensão econômica e geopolítica, mas apesar disso podemos incentivar e buscar ações de sístoles e diástoles que amortecem esse movimento e podem criar oportunidades para se realizar ganhos de comércio.
De fato, na RBCE 153 estamos investindo com recursos próprios diagnosticar e identificar oportunidades para a expansão da corrente de comércio brasileiro. Inicialmente, na nossa tradicional página azul abrimos espaço a António Rebelo de Sousa para expor como a SOFID e a FUNCEX estão a incentivar e a forjar a Cooperação Luso-Brasileira. Por sua vez, George Vidor na sua seção de comentário internacional analisa se exportar petróleo, importar derivados é bom, é ruim ou não tem outro jeito. A seguir, abordamos questões de trade finance. Para o setor de operações estruturadas para o setor do agronegócio há um artigo de Christian Ramos, ligando LE com CRE, sugerindo assim do ponto de vista legal como se poderá melhor estruturar essas operações. Além disso, há uma análise da equipe da Funcex expondo e propondo um novo market design para o Sistema de Financiamento e Seguro de Crédito às Exportações.
África é um mercado estratégico para o Brasil. Por isso, dedicamos uma série de artigos sobre África voltados preferencialmente para os operadores de comercio exterior. Mostramos um novo Hub de Negócios Internacionais com a África de autoria de Alexandre Brodheim e Pedro Gouveia, e apresentamos a África de A a Z de Rui Mucajé.
Acima dissemos que a promoção de exportações deve ser mais incentivada nos próximos anos. Em função disso abrimos espaço para que Joseph Couri mostrasse o caminho para o crescimento das micro e pequenas empresas no mercado internacional. E, há destaque também para os novos desafios da Apex-Brasil. Por sua vez, há ainda uma exposição ímpar sobre o agronegócio na economia brasileira de autoria de Eduardo Daher; e, tratamos também dos requisitos fitossanitários impostos nas aduanas chinesas. Considerando que o tema de sustentabilidade se torna um item da agenda dos dirigentes das empresas trazemos a reflexão e a prática de Humberto Bahia para o caso do e-commerce.
Também acima falamos que há dificuldades institucionais e negociais no âmbito da OMC, e por isso há um artigo sobre como se adotar medidas retaliatórias unilateral face ao “vazio” observado no órgão de apelação da OMC.
Cabe ressaltar que por sermos um Global Trader há espaço para crescer no comércio internacional por meio da expansão das exportações de bens e serviços. Podemos atrair maior volume de investimentos externos. E podemos incentivar a expansão de negócios sustentáveis, e de marca e da cultura brasileira no mercado internacional. Precisamos é saber aproveitar esse momento histórico de incertezas, mas que está repleto de oportunidades para serem conquistadas.